No Brasil, pessoas que cometeram algum crime mas foram consideradas inimputáveis por terem sido diagnosticadas com doenças mentais são encaminhadas para tratamento nos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP). Santa Catarina conta hoje com uma unidade, em Florianópolis, dentro da Penitenciária da Agronômica. Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em cumprimento à Lei Antimanicomial, deu prazo até o dia 28 de agosto para que o HCTP encerre as suas atividades. A partir dessa data, os internos deverão ser liberados para receber atendimento domiciliar, na rede hospitalar e nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs).
O assunto foi tema de debate na Assembleia Legislativa durante reunião conjunta das comissões de Saúde, Segurança Pública e Direitos Humanos, nesta terça-feira (09). Participaram representantes do governo do Estado, do Poder Judiciário, do Conselho Regional de Medicina, Instituto de Psiquiatria de Santa Catarina (IPQ/SC), entre outros.
No início do encontro, o proponente do debate, deputado Dr. Vicente Caropreso (PSDB), apresentou um histórico sobre a Lei 10.216/2001, conhecida como Lei Antimanicomial, que baseou a decisão do CNJ para o fechamento do HCTP. O parlamentar também citou crimes cometidos no estado que, segundo ele, exemplificam a importância da discussão. Entre eles, ataques a creches. “É nesse contexto que nós temos que avaliar todas as vertentes de situações que vêm se apresentando e que motivaram essa reunião. Um dos principais questionamentos hoje é se o nosso sistema de saúde vai conseguir atender a essas pessoas atualmente internadas.”
A diretora do HCTP de Florianópolis, Danielle Amorim Silva, contou que a unidade iniciou em fevereiro o processo de implementação da resolução do CNJ. Naquele momento, o HCTP tinha 98 internos. “Nós procedemos a desinternação da maior parte deles. Oito retornaram para o sistema prisional e 49 foram desinternados e retornaram para a sociedade. Atualmente, temos 14 pacientes que não têm condições de alta médica. Estamos em discussão com os órgãos responsáveis para que a gente pense e construa para onde essas pessoas serão encaminhadas caso se efetive o fechamento do Hospital de Custódia.”
Danielle também demonstrou preocupação com o regramento do CNJ que permite a liberação dos internos do HCTP sem o exame de cessação de periculosidade. “Eles estão sendo desiternados com relatório biopsicossocial, um documento construído por assistente social, psicólogo e o médico psiquiatra assistente, que não é um perito forense para atestar que aquele paciente não apresenta mais perigo. Atesta somente se tem condição da alta hospitalar”, contestou.
Sobrecarga no sistema de saúde
“O sistema de saúde de Santa Catarina não está preparado para absorver a demanda com o fechamento do Hospital de Custódia, já que parte dos pacientes deverão ser encaminhados para a rede hospitalar geral e para os CAPs, que hoje não têm condições de receber essa demanda”. A opinião é da desembargadora Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, que preside o Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Prisional e Socioeducativo do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
A desembargadora destacou que o assunto é delicado e complexo porque envolve temas sensíveis para as pessoas. “Trata-se de uma discussão que engloba a saúde mental e o cometimento de crimes. E desde que a resolução do CNJ foi publicada, nós estamos empenhados em cumprir o regramento de forma eficiente e segura para a população.”
O secretário de Estado da Saúde, Diogo Demarchi, compartilha da opinião de que o sistema de saúde não está preparado para atender a demanda. Segundo explicou, os hospitais gerais têm um limite de 15% para leitos psiquiátricos. O Estado tem também o Instituto de Psiquiatria (IPQ) que atende principalmente emergências psiquiátricas. “No final da década de 1980, o IPQ tinha mais de mil leitos psiquiátricos. Hoje, são 185 leitos e 72 pessoas que moram no instituto. Santa Catarina não está totalmente preparada para absorver a demanda do HCTP.”
Encaminhamentos
Ao final da reunião, o deputado Dr. Vicente Caropreso sugeriu que o governo do Estado, por meio da Procuradoria Geral do Estado (PGE), atue juridicamente para que seja estendido o prazo para o fechamento do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico. O parlamentar sugere que Santa Catarina siga os passos do governo do Rio de Janeiro, que obteve decisão liminar favorável no Supremo Tribunal Federal (STF) para manter os hospitais de custódia daquele estado em funcionamento.
Além disso, falou que vai entrar em contato com os deputados da Bancada Federal catarinense no Congresso Nacional para que reforcem as reivindicações no âmbito federal, inclusive solicitando ao Ministério da Saúde o envio de mais recursos para reforço do sistema de saúde no estado.